segunda-feira, 28 de novembro de 2011

O dano de uma prisão ilegal


Estou feliz com uma vitória que conseguimos contra um verdadeiro abuso de autoridades judiciárias do Estado.
A 18ª Vara da Fazenda Estadual condenou o Estado de Alagoas a indenizar nossa cliente, uma Sargento da Polícia Militar que foi presa injustamente e de forma abusiva por Juízes da 17ª Vara Criminal, condenando ao pagamento de R$ 50.000,00 por danos morais.
A Sargento passou 45 dias presa acusada de participação em uma quadrilha que cometeu vários assaltos graves no Estado. A mesma foi alvo de dezenas de matérias jornalísticas, inclusive com sua foto estampada nos jornais acusando a mesma de fazer parte da quadrilha.
A prisão foi mantida mesmo com parecer do Ministério Público pela revogação, além da mesma sequer ter sido apontada como suspeita destes fatos, não houve indiciamento, muito menos denúncia.
A PM abriu procedimento administrativo visando a punição da Sargento, tendo a mesma ainda sido alvo de discriminação de seus colegas de farda e da sociedade, que normalmente julga por antecipação, baseando-se apenas nas informações que a mídia transmite.
Tudo isso que ela passou gerou problemas de ordem psiquiátrica, onde até os dias de hoje ela se encontra impossibilitada de retornar ao seu trabalho normal, sendo obrigada a passar por tratamento médico e tomar remédios para conter suas crises nervosas.
Hoje na ânsia de se fazer justiça e dar uma resposta à criminalidade a prisão provisória tem se tornado uma regra, quando deveria ser uma exceção, e este caso demonstra a gravidade do dano que uma prisão injusta pode causar a um cidadão de bem, devendo esta postura atual do nosso Judiciário ser urgentemente revista, em nome da segurança jurídica e das garantias individuais tuteladas constitucionalmente.
Agora, resta aguardar se o Estado vai recorrer da decisão e enfrentar outra batalha para executar os valores condenados, porém, o sentimento de JUSTIÇA FEITA já pode ser sentido por esta vítima do Estado policial implantado em Alagoas.
O Estado responde objetivamente pelos danos que os seus agentes causem nessa qualidade a terceiros (art. 37, § 6º, CF), voltando-se regressivamente contra o agente se ele agiu com dolo ou culpa. Essa é a forma em que se estabelecem constitucionalmente os parâmetros da responsabilização do Estado por ação de seus agentes.” (Trecho da sentença)


28/11/11   Gustavo Dacal

segunda-feira, 3 de outubro de 2011

UM VEXAME DESNECESSÁRIO

O título classifica bem o que aconteceu com o CSA nessa equivocada participação na segunda divisão do Campeonato Alagoano, onde de forma vexaminosa o Clube e sua torcida mais uma vez foi exposto ao ridículo participando de um campeonato em que a maioria esmagadora dos Azulinos foi contra.
A idéia inicial sobre a participação do CSA neste campeonato partiu do Presidente do clube e do setor de Futebol, onde inicialmente seria uma boa idéia, caso fosse posta em prática da forma como foi concebida. Inicialmente o CSA participaria de forma indireta na competição, emprestando seus jogadores “da casa” juntamente com jovens do time sub-20 e sub-18 para que estes adquirissem experiência enfrentando times profissionais.

Na idéia original, o CSA entraria com a estrutura do mutange e vestiria a camisa de outro clube, para que o clube não fosse exposto em razão do trauma recente de ter jogado a segundona, argumento levantado por vários membros da diretoria, inclusive por mim, inclusive foi decidido que era melhor assim do que simplesmente emprestar jogadores a vários times, pois estes juntos já adquiriam entrosamento para competições futuras.

Do ponto de vista do futebol, realmente o clube estava sem calendário e precisava pôr seus jogadores em atividade, sendo este campeonato a única opção viável para manter os jogadores em atividade, porém, na prática o que aconteceu foi profundamente desastroso, primeiramente na formação da equipe, que deveria ser apenas de jogadores da base e com contrato com clube e o que aconteceu foi bem diferente.

Contratou-se um técnico que sempre faz bons trabalhos por Alagoas, mas que não conhecia de perto os jogadores da base, contrataram jogadores de fora do clube, sob o pretexto de proteger os garotos, porém a idéia não era “dar” experiência a estes garotos?

O mais lamentável foi a infeliz escolha de utilizar a camisa do Clube para esta competição, com o argumento pífio de que se tratava do CSA “B”, mas onde estava o CSA “A”????
Todos sabemos que a torcida do CSA ficou traumatizada pelas participações do time na segunda divisão do Alagoano, inclusive no ano de 2010, recentemente, tendo quase sido rebaixado novamente em 2011, então do ponto de vista do Marketing e da paixão que envolve o futebol, ficou claro que esta participação teria tudo para ser um fracasso, onde os torcedores virariam alvo de chacotas, atingindo a auto-estima destes, tão abalados pelos fracassos recentes.

O futebol sobrevive da paixão do torcedor, ele que move o Clube e é o único sentido de sua existência, pois o CSA não é uma empresa de venda de jogadores, é muito maior do que isso, é simplesmente o maior clube de futebol do Estado de Alagoas e não precisava de mais esse fato para abalar ainda mais sua imagem, história e a auto-estima do torcedor Azulino.
Como esperado, tudo deu errado, o time foi desclassificado na primeira fase, dívidas foram contraídas, os erros recentes foram repetidos e problemas futuros certamente virão, de ordem que não enxergo qual foi o lucro que o CSA teve para participar deste campeonato.

Do ponto de vista jurídico esta malfadada participação, do meu entendimento, é uma aberração, mesmo que já tenha acontecido algo semelhante em outros estados, acredito que da mesma forma foram fatos ilegais e irresponsáveis, razão pela qual após me manifestar contra, pelos motivos já expostos e pelo risco que o Clube passaria a troco de nada, acabei sendo voto vencido e decidi renunciar ao cargo de Vice-Jurídico, pois de forma alguma iria compactuar com tamanha falta de visão e irresponsabilidade.

Hoje estamos mais uma vez, sem calendário, desgastados com a torcida, com pendências financeiras e sob o risco de que essa “brilhante” idéia traga mais processos trabalhistas, dívidas e um dano imenso a imagem do Centro Sportivo Alagoano.

Valeu a pena????

quarta-feira, 29 de junho de 2011

A HIPOCRISIA DOS CRIMES MIDIÁTICOS

 Recentemente os Alagoanos vêm acompanhando alguns crimes de repercussão envolvendo normalmente, pessoas de maior poder aquisitivo ou da classe média, de forma que estes delitos são relatados pela mídia jornalística e acompanhados pela população como uma verdadeira novela da vida real.
No âmbito artístico, um filão bastante explorado há décadas nas novelas brasileiras é o referente a homicídios de pessoas importantes na trama fictícia, onde achar “o assassino” é uma missão cercada de mistério e emoções e seus desdobramentos e reviravoltas prendem a atenção dos espectadores até os últimos capítulos da novela.
Na vida real não vem sendo diferente, seja em âmbito nacional ou em terras Alagoanas, os chamados Crimes de Repercussão ou Crimes Midiáticos estão cada vez mais presentes nos bate-papos e discussões em todos os níveis da sociedade, onde cada um prolata sua sentença, condenando ou absolvendo as pessoas apontadas como suspeitos dos crimes.
As notícias envolvendo estes crimes normalmente vêm acompanhadas da frase: “Um crime que chocou a sociedade”.
O que seria um crime que choca a sociedade?
Todos os dias pessoas são assassinadas em Maceió e em todo o Estado de Alagoas, muitos desses crimes são bárbaros, de extrema violência, praticados contra crianças, idosos, mulheres, crimes passionais, relacionados ao tráfico de drogas, brigas de vizinhos, envolvendo os mais variados motivos dos mais graves aos mais banais, porém, apenas em alguns poucos crimes a mídia jornalística dá a devida atenção e cobertura.
É justamente a mídia que escolhe quais crimes “chocam a sociedade”, pois só choca aquele crime que envolve pessoas conhecidas no meio social ou provenientes das classes mais abastadas, de ordem que as vítimas de crimes tão ou mais violentos, quando são pessoas pobres, da periferia, não recebem o mesmo tratamento dos órgãos de imprensa, e o mais grave, não recebem a devida atenção das autoridades policiais e judiciais.
Tive a oportunidade de participar de um julgamento como defensor, de um crime que considero entre os mais bárbaros e cruéis de minha vida profissional, em que uma criança de 9 anos de idade foi brutalmente esfaqueada por um homem que residia em sua casa, recebendo cerca de 40 facadas, ficando com fraturas expostas decorrentes da violência dos golpes e com suas vísceras à mostra.
Este homicídio brutal foi praticado na frente de sua mãe, parentes e amigos, por um psicopata acolhido pela mãe da criança em sua casa, uma humilde residência na periferia de Maceió, de forma que indago: Alguém se lembra desse crime?
A resposta certamente é negativa, pois apenas três pessoas acompanhavam o julgamento, dois estagiários de direito e um segurança do magistrado que presidiu o Júri, nem mesmo a família da menor compareceu, não pude ver também nenhum órgão da imprensa, nem pessoas de camisas brancas pedindo justiça e paz, muito menos uma notinha de final de página em qualquer jornal relatando este crime que em tese, chocaria a sociedade.
O motivo parece óbvio: a vítima era pobre e negra, moradora da periferia, e seu algoz igualmente pobre e negro, um homem à margem da sociedade, que só foi julgado porque fui designado pelo magistrado como Defensor Dativo, ou seja, nomeado para fazer sua defesa, o que nos leva a certeza de que nossa sociedade é hipócrita e escolhe a dedo os crimes que a chocam.
As mais sérias consequências desses chamados Crimes Midiáticos, é a contaminação das autoridades públicas e o julgamento precipitado da própria sociedade.
Um fato concreto é o de que um crime de repercussão sempre tem uma atenção maior da polícia e do judiciário, resultando em investigações mais elaboradas e processos instruídos com um rigor diferenciado dos demais, levando a graves consequências, desde prisões tão midiáticas quanto os crimes em si, até a condenações sem provas capazes de levar alguém à prisão, apenas influenciados pela pressão social.
O processo penal para os crimes midiáticos é um processo “diferenciado”, onde o tratamento dado ao fato midiático é completamente inverso aos demais fatos corriqueiros na nossa sociedade, sociedade esta que passa por um momento de instabilidade social, com elevadas taxas de criminalidade e graves desigualdades sociais.
Normalmente os acusados por crimes desta natureza são expostos na TV, nos jornais e na internet como “os culpados” pelo crime que chocou a sociedade, estas pessoas tem suas vidas devassadas, sua imagem retratada de forma constrangedora, não recebem direito a uma defesa social, pois são verdadeiros inimigos da sociedade, retratados assim pela mídia, mesmo que de forma sutil.
A nossa constituição prega a igualdade, bem como nosso processo penal em tese, deve ser igualitário, oferecendo o mesmo tratamento para pessoas de qualquer classe social, raça, credo, etc...
A condenação social muitas vezes trás efeitos mais danosos que a própria condenação criminal, pois independente do resultado do processo, estas pessoas já foram condenadas pela sociedade em que vive, recebendo uma marca que nunca se apaga, são taxados de bandidos, mesmo sem um julgamento justo.
Sabemos que os crimes dolosos contra a vida são de competência do Tribunal do Júri, a mais democrática instituição judicial, onde a própria sociedade se reveste de Juiz, condenando ou absolvendo seus semelhantes, porém, esta instituição é a mais atingida pelo equivocado “julgamento midiático” em razão justamente de que seus Juízes de fato são membros da mesma sociedade, normalmente contaminados pelo apressado e impiedoso julgamento antecipado da mídia.
Devemos refletir sobre o verdadeiro papel da mídia jornalística nestes crimes ditos de repercussão e mais importante ainda, devemos evitar o julgamento antecipado e a execração pública de pessoas que ainda não foram julgadas, existindo sempre a possibilidade de que estas pessoas podem ser inocentes, pois a Justiça deve ser feita de forma imparcial, sem paixões e influências externas, onde uma condenação criminal, que gera graves conseqüências para o condenado, deve se pautar unicamente nas provas contidas nos autos e não na opinião pública que esta sujeita a injustiças.

Gustavo Dacal – 20/06/11

quinta-feira, 3 de fevereiro de 2011

Torcidas Organizadas x Segurança Pública



Recentemente o futebol Alagoano vem enfrentando uma grande polêmica relacionada à existência das torcidas organizadas, onde o Ministério Público Estadual por meio de uma Ação Cautelar, requereu a proibição, de forma temporária, do uso de camisas, bandeiras, faixas e demais materiais relacionados às torcidas organizadas, visando combater a violência supostamente vinculada à atuação destes grupos.

O problema da violência no futebol é antigo, sendo algo enfrentado por diversos países.

A Inglaterra, país inventor do futebol, que detêm o campeonato mais lucrativo e organizado do mundo, com alguns dos maiores clubes do planeta, já enfrentou e combateu a violência nos estádios de futebol, com os famosos “Hooligans”, torcedores dos clubes ingleses conhecidos pela forma violenta de apoiar seus times e enfrentamentos com clubes rivais.

A maior tragédia relacionada ao Futebol Inglês aconteceu em 1985 na final da Taça dos Campeões, quando o Liverpool jogou contra a Juventus da Itália em um estádio na Bélgica, onde morreram 38 pessoas e centenas ficaram feridas, devido à atuação dos Hooligans do Liverpool.

Na Argentina os “hooligans” recebem o nome de “Barras Bravas” que são as torcidas organizadas dos clubes argentinos, conhecidos pelo fanatismo e pela violência, existindo diversos episódios violentos envolvendo a “La 12”, torcida organizada do Boca Jrs., “Los Diablos Rojos” organizada do Independiente e ainda “Los Borrachos del Tablón “  torcedores do River Plate, além de outros grupos espalhados pelo país vizinho, causando problemas e polêmicas.

No Brasil tivemos vários casos de violência em Estádios de futebol, inclusive com mortes, fatos que acontecem até os dias atuais, onde cotidianamente pessoas são mortas pela violência relacionada às torcidas organizadas de forma que em vários estados, como em Alagoas, o Ministério Público vem atuando contra estes grupos e pedindo judicialmente a extinção das Torcidas Organizadas.

Diante deste quadro, será que a extinção é uma medida eficaz?

Quais as origens desta violência?

Em Alagoas o problema das Torcidas Organizadas vêm cada vez mais se agravando e a partir do ano de 2005 a controvérsia aumentou em razão do processo judicial de extinção das maiores torcidas do Estado, a Mancha Azul do CSA e a Comando Vermelho do CRB, tendo ao final apenas a Comando Vermelho sido extinta, na verdade, juridicamente nunca existiu, pois não possuía personalidade jurídica nem estatuto registrado, diferente da Torcida Mancha Azul que continua a existir legalmente, mas na prática ambas continuam em atividade.

À época da proibição das torcidas em decisão liminar (temporária), o que se observou nos estádios foi que os grupos continuaram a existir sem qualquer mudança prática, a não ser a ausência de camisas e materiais alusivos às suas marcas, porém, usou-se outra nomenclatura e os grupos continuaram os mesmos, concentrando-se nos mesmos locais e entoando os mesmo cânticos.

Na história recente dos jogos no maior estádio de Alagoas, com exceção de pequenos incidentes, não foram registrados conflitos ou problemas graves dentro do Rei Pelé, apesar da existência das Torcidas Organizadas, ocorrendo casos de violência normalmente nos arredores do Estádio ou até em bairros distantes do campo de jogo, inclusive em dias em que não havia jogos.

Um dado real em que não podemos desassociar, é que a violência imputada às torcidas vem aumentando gradativamente junto aos índices de violência geral do Estado de Alagoas, principalmente em Maceió, hoje considerada uma das cidades mais violentas do Brasil, com os piores indicadores sociais entre as capitais, em que a periferia vem sendo tratada com descaso pelas autoridades competentes, e os jovens são as principais vítimas desta violência.

Então, será que a violência supostamente existente nas torcidas, origina-se na violência enfrentada pelos jovens no cotidiano em que vivem?

A maioria dos integrantes, (oficiais e não-oficiais) das torcidas são jovens, boa parte menores de 18 anos, faixa etária que mais se relaciona à violência, maiores vítimas de homicídio e também são maioria no sistema prisional, que abriga um grande número de pessoas entre 18 e 25 anos.

Em uma observação crítica, percebe-se que boa parte dos integrantes das Torcidas são jovens entre 14 e 25 anos e moradores de bairros periféricos e pobres de Maceió, que se aglomeram em grupos, algumas vezes violentos, com uma formação semelhante a gangues, fenômeno comum em países como os Estados Unidos em que gangues de jovens são formadas por bairros ou raça, com enfrentamentos violentos constantes entre grupos rivais.

De fato a existência da violência relacionada às Torcidas Organizadas é um problema real e deve ser combatido, mas para combater o problema, se devem conhecer suas origens, seu desenvolvimento, não basta apenas proibir, extinguir as torcidas, pois na prática esta medida já se mostrou ineficaz, vide exemplo da Torcida Mancha Verde do Palmeiras em São Paulo, extinta há vários anos, mas que na prática continua a existir sob a denominação de Mancha alvi verde.

Um grande erro cometido pelas autoridades é a associação simplista de que a violência entre estes grupos tem origem apenas no futebol, ledo engano!

Infelizmente, nem sempre as autoridades tem o conhecimento aprofundado do tema, quando algumas pessoas que tratam do assunto sequer freqüentam jogos de futebol, obtendo dados apenas por meio da imprensa e informações que muitas vezes não oferecem a devida credibilidade.

O futebol representa a alma do brasileiro, talvez a maior identidade deste país, onde como um esporte que é, trás saúde, lazer, movimenta a economia, e a rivalidade entre os maiores clubes do Estado pode sim ser algo saudável, bastando para isso educar os torcedores e punir os baderneiros individualmente.

O combate a violência nas torcidas organizadas é uma ação de política social e não só de repressão policial, engana-se quem pensa que o problema será resolvido pela via da extinção formal dos grupos, medida ingênua que não vai acabar com o problema, correndo inclusive o risco de agravá-lo, pois sem o material que os identifica, qualquer cidadão mal intencionado pode se camuflar em meio a torcedores comuns para praticar crimes.

Com as torcidas extintas, quem irá controlar os grupos inominados que continuarão a causar problemas?

Como responsabilizar estes grupos que sequer existem?

A ação correta é prender, identificar, julgar e condenar aqueles indivíduos que realmente cometeram crimes e não punir uma entidade responsabilizando objetivamente todo um grupo por atos praticados individualmente,  por supostos membros destes grupos, isso incorreria em ilegalidade inclusive.

Seguindo este raciocínio, será que agora passaremos a punir a Instituição da Polícia Militar por crimes praticados por maus policias?

É justo demonizar toda uma instituição e até extinguir a mesma por atos isolados de pessoas que nem sempre são seus membros?

Acabar com as torcidas dentro do Estádio é acabar com o futebol Alagoano, que vem em decadência há anos e não precisa de medidas deste tipo, que além de punir os torcedores, punem os clubes, tiram o brilho do evento.

O espetáculo futebolístico não se resume aos 22 atletas em campo, mas o que abrilhanta ainda mais os jogos, é a festa das torcidas nas arquibancadas e em especial das torcidas organizadas, são elas que levantam a massa de torcedores nos estádios, transformando o jogo em uma festa.

O Poder Judiciário recentemente, por meio de uma decisão cautelar, provocado pelo Ministério Público, proibiu, de forma genérica, a entrada de torcedores no estádio Rei Pelé em jogos de CSA e CRB, com “qualquer objeto ou apetrecho que contenham ou façam menção ou os caracterize, ainda que de forma indireta, como integrantes e/ou simpatizantes das torcidas organizadas do CRB ou CSA.”, ou seja, caso um torcedor qualquer, simpatizante de alguma torcida queira adentrar no estádio com a camisa representando a torcida, ele será impedido pela Polícia Militar, por determinação judicial, mesmo que ele esteja com ingresso comprado, ele será impedido de usufruir do espetáculo esportivo o qual pagou.

Dai nos perguntamos: Onde fica o direito do consumidor pagante de ingresso de se manifestar livremente?
A decisão liminar intentada pela Promotoria Coletiva Especializada de Defesa do Consumidor visa proteger um interesse coletivo dos consumidores, que são neste caso, as pessoas que pagam por seu ingresso para em contrapartida, assistir nas dependências do Estádio o jogo do seu time, ou da torcida a qual é simpatizante.

Este torcedor, adepto de uma determinada torcida, seja ela organizada ou não, tem pleno direito de assistir ao jogo com a vestimenta que ao seu livre arbítrio seja escolhida, respeitando evidentemente, a moral e os bons costumes.

Proibir o uso do material da torcidas ou extinguir tais associações, além de medida ineficaz e abusiva, é querer esconder o lixo debaixo do tapete, é algo inconveniente, que sequer irá amenizar os reais problemas, pois, qualquer um que freqüenta os jogos de futebol sabe que dentro do estádio em raras oportunidades acontecem tumultos ou atos de grave violência.

O que se percebe é que muitas vezes alguns atos de vandalismo ou violência, são praticados em bairros distantes do Estádio, e mesmo assim, de forma equivocada, se associa este ato isolado ao espetáculo futebolístico, mesmo sem que seja possível comprovar que estas pessoas responsáveis pelo fato ou vítimas estavam presentes ao estádio, ou seja, que este indivíduo seja consumidor dos jogos de CSA e CRB, ou ainda, que tenha lesado direito tutelado pelo Código de Defesa do Consumidor.
Trata-se na verdade, de um problema de segurança pública, de interesse de toda a sociedade, pois seguindo a mesma lógica, vamos proibir a transmissão de jogos pela televisão de times do eixo Rio / São Paulo, onde temos registros, seja na capital ou no interior, de crimes cometidos após discussão relacionada a estes times, sendo assim, proibi-se a manifestação de preferência futebolística?

A medida correta, na nossa visão, seria um maior investimento público em segurança, em capacitação da força policial, para que assim tenham efetivo preparo para lidar de forma eficaz contra esta violência, no sentido de punir verdadeiramente os responsáveis diretos por estes crimes, coibindo o crescimento da violência na capital de Alagoas.

Observa-se na prática, que diversos abusos foram cometidos em razão desta decisão judicial, que tem caráter vago, impreciso, de natureza genérica, existindo casos extremos onde um torcedor foi barrado de forma truculenta na entrada do Estádio por querer adentrar com a bandeira de Alagoas, símbolo maior do Estado, o qual as mesmas autoridades que fizeram a proibição são subordinadas.

Os efeitos negativos desta medida respingam ainda no torcedor de bem, como por exemplo os torcedores das “Charangas” de CSA e CRB, proibidos de ingressar ao Estádio com seus instrumentos, formada em sua parte por pessoas idosas, pais de família que há décadas e de geração em geração formam orquestras de metais e percussão para animar os torcedores, algo que já faz parte da cultura do futebol Alagoano.
Os membros das “Charangas” também são consumidores enquanto pagantes de ingresso?
Caso um grupo de cidadãos decida formar uma torcida, denominando-a Torcida da Terceira Idade, a título de exemplificação, em razão da violência alheia, eles estarão proibidos de expressar seu pensamento em forma de frases em material próprio, como camisas, faixas e demais objetos de uso pessoal?

A Constituição Federal garante a liberdade de manifestação de idéias, pensamento, ela protege a liberdade de expressão, e o direito à liberdade de ir e vir, vedando qualquer impedimento da liberdade individual, senão em virtude de lei, de forma que esta medida judicial é inconstitucional e ilegal, por ser um ato que proíbe a livre manifestação do pensamento.

As intenções do Ministério Público e do Poder Judiciário são as melhores possíveis, no sentido de resguardar a sociedade, porém, combater o mal com uma medida equivocada, lesando a própria coletividade, não seria o caminho mais prudente, de forma que “torcemos” para que esta atitude seja revista, considerando principalmente os resultados que certamente serão desastrosos como os já presenciados.

Além do prejuízo dos torcedores / consumidores, perdem ainda os clubes de futebol, que convivem com rendas insuficientes para manterem suas atividades de forma satisfatória, afastando ainda mais o público dos estádios, onde com um bom esquema de segurança e investimento em educação do público, o jogo sempre transcorrerá em paz.

Conclui-se que o problema da violência relacionada ao futebol é algo real, mas encarado de forma equivocada, devendo toda a sociedade, principalmente os desportistas e aqueles verdadeiros consumidores, os torcedores, debaterem de forma franca o futuro do Futebol Alagoano, para desta forma atacar o problema com medidas verdadeiramente eficazes.



Elaborado em 29/01/11.

Por: Gustavo Dacal - Advogado, Especialista em Ciências Criminais e Vice-presidente Jurídico do Centro Sportivo Alagoano.